Solidariedade na Governança da IA

Solidariedade, Não Velocidade, para a Governança da IA

Em 12 de junho de 2025, a International Foundation for Electoral Systems (IFES) lançou o grupo Artificial Intelligence Advisory Group on Elections (AI AGE) no Carnegie Endowment for International Peace em Washington, D.C. Esta iniciativa é a primeira do tipo a reunir autoridades eleitorais — essenciais guardiãs da democracia — de todo o mundo e alguns dos principais especialistas em IA para enfrentar os desafios que a IA impõe à democracia e imaginar novas possibilidades para seu uso.

Os corpos de gestão eleitoral fundadores da iniciativa incluem países como Argentina, Indonésia, Quênia, Taiwan e Ucrânia.

O AI AGE reúne alguns dos pensadores mais inovadores para garantir que a IA fortaleça, e não subverta, a democracia. Entre eles estão Katie Shay, que fundou o programa de IA responsável da Cisco; Audrey Tang, primeira ministra digital de Taiwan, que defendeu uma abordagem descentralizada para a identificação digital; e Sujata Mukherjee, que construiu um consórcio de pesquisa de confiança e segurança em países da maioria global.

O AI AGE é fundamentado na crença de que, para garantir que os benefícios da IA sejam distribuídos de forma equitativa, não precisamos agir mais rápido — como aqueles que buscam o sonho da inteligência geral artificial nos fazem acreditar — mas sim de forma mais estratégica.

As Altas Apostas

Em maio de 2025, o presidente Donald Trump embarcou em uma turnê diplomática pelo Golfo com um grupo de bilionários da tecnologia, contratantes de defesa e financiadores. Durante danças com espadas e jantares luxuosos, eles fecharam uma série de acordos importantes: um enorme centro de dados de IA nos Emirados Árabes Unidos, apoiado pela OpenAI e um conjunto de empresas do Vale do Silício, além de mais de 23 bilhões de dólares em investimentos prometidos entre o novo gigante da IA da Arábia Saudita, HUMAIN, e empresas de tecnologia dos EUA.

A visita destacou a visão dos estados do Golfo de que a IA é a pedra angular de uma economia pós-petróleo. Também revelou uma mudança mais profunda nas dinâmicas de poder global: os estados não estão mais apenas contratando empresas de tecnologia, mas elevando-as a parceiros na governança. Isso está acontecendo em grandes e pequenas escalas.

Exemplo do Brasil

Um exemplo disso pode ser visto quando, em abril deste ano, o governo brasileiro e o parceiro do setor privado baseado no Vale do Silício, DrumWave, lançaram o dWallet, uma carteira digital que permite aos cidadãos monetizar seus dados pessoais ao trocá-los com empresas por lucro. Esta iniciativa, a primeira do seu tipo, é anunciada como um esforço para empoderar as pessoas comuns a tomar posse das informações privadas que as empresas de tecnologia e seus corretores de dados frequentemente acessam gratuitamente.

No entanto, ao fazer isso, o dWallet também transformou um direito humano fundamental — a privacidade — em uma mercadoria que pode ser leiloada para o maior ofertante. O Brasil atualmente possui um dos regimes de proteção de dados mais robustos do mundo, tendo implementado a Lei Geral de Proteção de Dados em 2020 e emendado sua constituição para incluir a proteção de dados como um direito fundamental em 2022. Agora, um projeto de lei está sendo discutido no Congresso Nacional do Brasil que propõe emendar esse regime para que seu princípio orientador não seja a proteção, mas a monetização.

Desafios na Governança da IA

Os líderes da indústria, tecnólogos e formuladores de políticas falharam em criar um modelo democrático para governar as redes sociais, e desde a sua invenção, temos lutado para acompanhar, sem sucesso. À medida que a IA se estende a mais e mais domínios da vida pública, o mundo agora corre o risco de repetir esse fracasso. Mas isso não significa que devemos adotar a mentalidade de “mover rápido e quebrar coisas” que tem sido abraçada por empresas de tecnologia e autoritários.

O AI AGE defende uma temporalidade diferente: a de diálogo, deliberação e debate. Este é o ritmo da democracia. Enquanto a velocidade é usada como uma arma para contornar mecanismos de responsabilidade e consolidar poder, a lente estratégica da lentidão é uma ferramenta que os democratas podem usar para garantir consulta e inclusão. Esses não são bugs, mas características essenciais da governança democrática.

O Legado da Internet

A internet inicial incorporava o tipo de ethos democrático que podemos buscar hoje como guia. A deliberação entre empresas como Netscape, o governo dos EUA e tecnólogos como Tim Berners-Lee deu origem ao World Wide Web Consortium (W3C), que desenvolveu padrões abertos para a web fundamentados na liberdade de expressão, engajamento de múltiplas partes interessadas e acesso à informação. Embora longe de ser um modelo perfeito, o W3C é uma das razões pelas quais ainda temos uma internet global e aberta hoje.

Funcionários eleitorais, tecnólogos, defensores dos direitos humanos, governos democráticos e muitos outros interessados de todo o mundo têm um papel central a desempenhar na definição de padrões e normas globais para a governança da IA. Como disse a embaixadora cibernética e membro do AI AGE Audrey Tang durante suas declarações no lançamento do AI AGE: “Uma corrida vertical e de soma zero em direção a uma singularidade tecnológica deixa todos para trás. Mas, com um movimento horizontal e de base de pluralidade, a tecnologia se torna uma aliada vantajosa.”

Em uma era de mudanças tecnológicas rápidas e autocracia acelerada, a verdadeira inovação reside não na velocidade, mas na solidariedade. O futuro pode ser mudado — mas somente se lembrarmos que a democracia, assim como a inteligência geral artificial, não é inevitável.

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